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Maternidade solo e abandono paterno

  Primeiro quero esclarecer que não existe mãe solteira, maternidade não é estado civil. Segundo, para mim é impossível falar deste tema sem abordar o machismo enraizado. Alguns argumentam que entendem as feministas de antigamente, havia muito a ser conquistado, que hoje as mulheres já podem fazer o que querem. 
   Podem? Pode até ser que possam, mas podem fazer tudo que os homens fazem sem julgamento? Podem ser abusadas, agredidas, mortas sem serem culpadas ou questionadas? Podem abortar? Podem abandonar seus filhos? Podem nem querer ter filhos sem serem julgadas? Não sei para as outras mulheres, mas eu já ouvi que uma mulher sem filhos não é completa, que eu digo que não quero filhos porque não encontrei a pessoa certa, que mulher nasceu pra ser mãe, ou se sou lésbica, como se lésbicas não quisessem relacionamentos e filhos. Cresci cercada de bonecas, rodinhos, vassourinhas, batedeiras, coisas que moldam a sociedade, que fazem a mulher crescer com esse “sonho” de ser mãe imputado. Já os homens são vistos como “mulherzinhas” se brincam de boneca, o menino pode virar “viado”, porque não é coisa de homem cuidar de bebês.
   Quando observo esse modelo fico pensando se bebês se fazem sozinhos, se a mulher faz filho com o dedo, porque de um lado temos o incentivo à mulher para ser mãe desde a infância, do outro lado temos os homens que são criados para gostar de futebol, carreiras promissoras e que cuidar de bebês é coisa de mulher e gay.  Como isso poderia dar certo?
   Se um homem não assume seu filho o que dizem? “Ah é normal” “Ah homem é assim mesmo” “Pai é qualquer um”. Mas quando uma mulher decide deixar seu filho ela não presta, é desalmada, não tem o instinto materno. A mulher não precisa nem abandonar seu filho, basta ela decidir trabalhar e deixar a criança com parentes, babá que ela é questionada sempre sobre quem está com a criança, se ela não acha que vai perder os momentos, a mulher sai de casa para trabalhar carregada de culpa subconsciente. E se ela está no barzinho/balada? Mas não pode, e o bebê? Vocês escutam alguém perguntando pro homem no trabalho, bar, balada, cadê seu filho? Quem está olhando? 
   A verdade é que a responsabilidade de um filho sempre recai sobre a mulher. Se engravidou foi porque quis. Se o cara abandonou não soube escolher direito. A mulher perde sua identidade quando torna-se mãe, ela não faz nada sem que a perguntem quem está com seu filho, como se ela fosse sair e deixar a criança com o cachorro de babá. Já o homem? Se ele é pai dizem “ooohhh como fulano é maravilhoso, ele AJUDA fulana com o bebê, ele toma conta, ele troca fralda”, o homem que cuida de seu filho é visto como herói. Se ele decide só dar a pensão ele é ótima pessoa, faz sua parte, da dinheiro e pega a criança pra tirar duas fotos um dia da semana e posar de pai do ano. Já a mulher é acusada até de ter engravidado para ganhar pensão.
   Se existe uma piada maior que essa eu desconheço. Fazendo uma conta simples já vemos o quanto uma criança custa e o quanto o valor estipulado pra pensões é baixo e insuficiente. E para além do dinheiro temos todo o resto. Carregar uma criança por 9 meses, a dor do parto, do pós parto, as noites em claro, mudança do corpo, a responsabilidade com a saúde, educação, o tempo dedicado a crianças é de valor imensurável, mas todo esse papel não merece aplausos, porque ela não faz mais que sua obrigação, seu instinto natural é este. 
   Será que não precisamos mesmo do feminismo? Será que temos tudo que queremos? Fazemos o que queremos sem julgamentos? Podemos escolher não ter filhos? Será que o homem pode ser cobrado a ser pai assim como somos cobradas a sermos mães heroínas? Eu sonho e luto para que sim.

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