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O nome dela é...

   Jeniffer! Sim, Jeniffer. Não sou muito de ouvir músicas assim, acho muito parecidas, repetitivas, machistas, enfim, mas às vezes escuto e adoro a resenha, os memes... Mas o que significa a Jeniffer? Bom, quando soube que a “Marcelina” era a Jeniffer corri pra assistir o clipe e ouvir direito a letra da música. E pensei em algumas coisas...
   Pra começar temos uma mulher gorda, sim gorda, ser gorda não é ofensa, o preconceito que é. Pela primeira vez que me lembre temos uma mulher gorda, linda, sensual, desconstruída, que estava no Tinder e poderia ser namorada. Quantas informações interessantes, rs. 
   Me fez pensar primeiramente que temos tido maior visibilidade para mulheres que quebram padrões, padrões esses que são impostos pela sociedade a fim de lucrar com o desespero daquelas que não nasceram neles mas querem se enquadrar. E aqui deixo claro que não há problema em querer emagrecer, ganhar músculos nem nada disso, só é importante pensar quais as motivações e não se desgastar nem se desamar no caminho. 
   Dito isso, certamente em dias de barriga negativa é muito importante que as mulheres se vejam tão bem representadas. É muito importante que todas nós sejamos representadas. O Brasil é um país colonizado e de misturas raciais diversas, que importou um modelo europeu/americano de beleza praticamente inalcançável. Quem assim como eu era uma criança negra de cabelo muito cacheado mas só tinha bonecas brancas magras, loiras e de olhos azuis? Creio que 99,9%.  Era meio óbvio que eu nunca seria daquele jeito na vida! E isso mexe com todo o futuro das crianças que crescem sem sentirem representadas, sem verem modelos positivos de como elas são, sem referências reais do que podem realmente ser, e correm sério risco de aceitarem coisas que não merecem, porque acham que merecem menos, de ficarem presas em relações tóxicas, de não encontrarem seu amor próprio.
   A mulher ainda tem outra desvantagem desde a infância, que é a diferença dos brinquedos “para meninas e para meninos”. Os ditos brinquedos de meninas são rosas e remetem em quase totalidade a maternidade e serviço do lar. Já os brinquedos pensados para meninos envolvem carros, negócios, engenharia, brincar de boneca é coisa de mulherzinha, kit vassourinha rodinho e pazinha? Brinquedo de mulherzinha. O menino pode virar gay quando crescer. Tédio dessa sociedade.
   Voltando à questão inicial, não somos representadas desde a infância, não somos estimuladas e incentivadas a nos sentirmos lindas como somos! Hoje já temos algumas bonecas negras, quando eu era criança o máximo que tínhamos era a Susie, que tinha o corpo com mais curvas, rostinho redondo, me lembro que quando tinha uns 11 anos enchi a casa de bilhetes pedindo uma pra meu pai. 
   Mas tudo isso ainda é pouco demais! Eu quero ver “Barbies” negras com traços e cabelos negros, corpos negros, corpos gordos, corpos sem curvas, corpos baixos, corpos magros, corpos com seios pequenos, corpos com sardas, pintas, vitiligo. Quero brinquedos que estimulem as meninas a pensarem em suas carreiras, que as façam se livrar desse estereótipo de felicidade atrelado ao casamento e maternidade. Quero que os meninos sejam incentivados a tratar bebês e mulheres com respeito e amor, a entender que se ele come e suja ele também cozinha e limpa, que se ele fez o filho ele também acorda de noite e troca fralda, e que isso não é ajuda. 
   Quantos professores negros você teve? Quantos médicos negros você vê nos hospitais? Quantos negros e gordos tem na sua série favorita com papel de destaque e sem ser o “bobo da corte”? Quantos juízes negros nós temos? Quantos doutores negros? Você que não é negrx namoraria negrxs? Quantos negros temos nas novelas sem serem empregados ou escravos? Quantos negros temos no Brasil? 
   É, comecei com a Jeniffer e divaguei sobre vários outros padrões que precisam ser quebrados, sobre papéis que devem ser repensados, sobre o tipo de representatividade que queremos. Porque foi isso que a Jeniffer despertou em mim, não foi só uma musiquinha chiclete (apesar de que foi por umas duas semanas pra mim, rs), mas me fez pensar que precisamos de mais disso, de muito mais!

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