Nasci negra, quando criança meu tom de pele variava bastante, até que fiquei da cor que tenho hoje. Da mesma forma meu cabelo mudou ao longo dos anos, a raiz sempre foi mais lisa, mas a ponta bastante cacheada. Me lembro o quanto sofria pra lavar e pentear o cabelo, puxa daqui puxa dali, os braços de minha mãe doíam. Minha mãe se especializou em penteados, tranças, trancinhas, rabos de cavalo, maria chiquinha, tudo que pudesse controlar aquele volume.
Ainda antes dos 10 anos minha mãe começou alisar meu cabelo, só a parte da franja, que sempre teve uns “quebradinhos”. Quando fiz 18 anos resolvi que não dava mais pra suportar aquele cabelo, era difícil lidar com os cachos, empoderamento capilar não estava em alta, tampouco o feminismo, a escova progressiva entrou em cena e resolvi arriscar, achando que meu cabelo não ficaria liso, apenas mais “controlado”. E aí veio a surpresa, a progressiva deixou meu cabelo “liso”, eu lavei lavei lavei, cortei cortei cortei, até me livrar dela.
Bom, o que aprendi com isso? Até os 18 anos eu era até negra, depois da progressiva virei morena. E é aqui que chego no colorismo. O colorismo significa resumidamente que o racismo e a opressão dependem do quanto nossa pele é escura. Embora esteja relacionado ao tom de pele vivemos num país de índios, colonizado por europeus, que recebeu imigrantes e negros escravizados, ou seja, uma miscigenação que gerou uma enorme variedade de traços, cabelos, corpos e cores.
E o colorismo traz esse conceito, a discriminação pode ou não acontecer dependendo do tom de pele, formato do nariz, espessura dos lábios. Uma negra de traços finos e cabelo mais fino não é considerada negra, é morena. Acontece que a definição de morena é uma pessoa branca de cabelos escuros.
Por que não podemos mais ser negrxs? Quando digo que sou negra as pessoas dizem em tom de defesa “não, você é morena”, dia desses ouvi que eu tenho um pézinho fora da senzala, como se ser negra fosse algum tipo de ofensa da qual precisemos ser defendidas.
E porque? Porque é tão difícil associar o negro a algo positivo? A algo belo? Algo de que nos orgulhamos? O povo negro não era escravo, foi um povo que foi escravizado, e os resquícios ficaram até hoje... Quantxs médicxs, juízxs, doutorxs, estrelas de cinema, protagonistas e etc negrxs nós vemos? Quantxs domésticxs, garis, moradorxs de rua, papéis de empregadxs negrxs nós vemos? Que papéis ocupamos na sociedade? Como somos vistos? Até quando precisaremos lutar para derrubar o racismo?
Até quando iremos ter nossa negritude relativizada? Tons de pele relativizados? Você é mais clarinhx pode passar, você que é mais escurinhx fica aí. E o maravilhoso “Eu não tenho preconceito, até tenho amigos negrxs”? E o mimimi? E a dificuldade de encontrar emprego por causa do cabelo? Do tom de pele? Dos traços? E aquelxs que até namoram negrxs, mas Deus os livre de casar e ter filhxs negrxs.
Até quando iremos ter nossa negritude relativizada? Tons de pele relativizados? Você é mais clarinhx pode passar, você que é mais escurinhx fica aí. E o maravilhoso “Eu não tenho preconceito, até tenho amigos negrxs”? E o mimimi? E a dificuldade de encontrar emprego por causa do cabelo? Do tom de pele? Dos traços? E aquelxs que até namoram negrxs, mas Deus os livre de casar e ter filhxs negrxs.
É necessário que exista a noção de pertencimento. Que nos aceitemos enquanto negrxs. Que lutemos. Precisamos resistir, nos unir. Não chegamos até aqui para voltar atrás. Querem trazer o retrocesso, mas precisamos seguir aavante!
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